Sarah Ghedin Orlandin | 20 de Agosto de 2012

A súmula 370 do Superior Tribunal de Justiça, votada de forma unânime, que teve o projeto relatado pelo ministro Fernando Gonçalves, apresenta a seguinte redação: “caracteriza dano moral a apresentação antecipada do cheque pré-datado”.

O texto sumulado ratificou o entendimento que já era adotado, sendo que se colocando na posição do emitente do cheque a linha de raciocínio abordada é justa, uma vez que este se prepara financeiramente para levantar fundos na data combinada para a apresentação do título.

De outro norte, faz-se importante dizer que o cheque é uma ordem de pagamento à vista para o direito cambiário, contudo é de conhecimento notório que no Brasil os correntistas fazem uso do cheque de forma pré-datada, mesmo não existindo uma norma legal que discipline essa ação.

Portanto, resta nítido que o texto sumulado não é uma ofensa ao direito cambiário, mas sim um arrimo para o instituto da responsabilidade civil, pois ao emitir cheques pré-datados o indivíduo está certo de que realizou um negócio com condições, mesmo que tal negócio não esteja devidamente formalizado.

Nesse sentido, verifica-se que está sendo amadurecido o entendimento de que quando o comerciante aceita um cheque pré-datado, este se compromete em não apresentar o título à instituição financeira antes do prazo acordado, portanto caso seja descumprido o pacto insurge o dever de indenizar o emitente.

Por mais que seja lógico, vale destacar que o fato de ter um cheque apresentado antes do prazo combinado pode causar danos à vida financeira do emitente, considerando que este se organiza devidamente para que não seja surpreendido de forma negativa.

É válido afirmar que o cheque circula, desta forma o título pode parar nas de um terceiro de boa-fé, ou seja, um sujeito que não possui relação ao negócio realizado entre o emitente do título e o comerciante pode receber o título.

Assim, muitas vezes o terceiro que recebe o cheque não possui conhecimento sobre o negócio entabulado, desta forma este não pode ser prejudicado.

Portanto, a aplicação da súmula em comento não é uma regra geral, pois deve ser considerado que o terceiro de boa-fé que vier a receber um cheque pré-datado pode não estar ciente desta condição do título.

Com efeito, o terceiro de boa-fé resta desprotegido pela súmula em questão, porém a sistemática cambial lhe ampara.

A matéria exposta é muito delicada, pois o entendimento sumulado visa de forma louvável proteger o emitente do título, porém o cheque para o direito cambial é um título autônomo, entretanto o terceiro de boa-fé deve ser considerado, eis que este não possui relação com o negócio anteriormente firmado, onde inclusive não figura como parte. E, para completar o imbróglio não há disposições que orientem as instituições financeiras a aceitarem ou não um cheque com uma data futura.

Desta forma, cada caso deve ser analisado de forma isolada, já que a aplicação da súmula 370, do Superior Tribunal de Justiça, não é uma regra geral, porém esta protege o emitente que programa os seus pagamentos e acredita que ao emitir um cheque pré-datado realizou um negócio.

Por fim, somente a título de curiosidade a usual expressão cheque pré-datado encontra-se equivocada juridicamente, sendo correta a expressão pós-datada, que provem do latim post que faz referência a um fato futuro, de acordo com a doutrina de José Maria Othon Sidou (“Do Cheque”, 4a Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2000).

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